Minha Pátria é Campo Grande - Um Presente ao Morenismo

Dia 15 de outubro, quinta-feira passada, tivemos a abertura da II Conferência Municipal de Cultura de Campo Grande. Como convidada ilustre, participou da mesa, Maria da Glória Sá Rosa, a professora Glorinha.
Em sua fala ela homenageou os artistas de Campo Grande com uma linda poesia que, ao final do evento, gentilmente doou para que pudéssemos posta-la em nosso blogger.

Obrigada professora Glorinha por tão belas palavras:



Minha pátria é Campo Grande

“A minha pátria é onde o vento passa,
A minha amada é onde os roseirais dão flor
O meu desejo é o rastro que ficou das aves,
E nunca acordo deste sonho e nunca durmo”. Sophia de Mello Breyner Andresen

A cidade que escolhemos para ser nossa pátria é única em si mesma... Nossa ligação com ela é uma espécie de pele que nos veste da qual não conseguimos nos livrar. Nascemos para desfrutar de seu ar, de sua vegetação, de seu poder de nos manter ligados ao ritmo interior, que é sua marca especial.

O que dá sentido a Campo Grande é a força dos que nasceram para compor, pintar, escrever, construir casas de sonhos, porque para eles a vida só tem sentido quando criam e tecem os fios das realizações que justificam sua presença neste mundo.

Muitos anos atrás, em minhas noites de insônia, cheguei a definir Campo Grande como uma cidade onde atores refaziam as mesmas cenas na busca de uma paz inexistente. Hoje sei que ela vale pelo trabalho de seus artistas. Sem eles a vida seria como um grito parado no ar, silêncio incapaz de desdobrar-se em música.

Em Campo Grande sinto passar o vento transfigurador da criação, quando assisto na Concha Acústica Família Espíndola vibrarem as vozes e os sorrisos de nossos compositores, na celebração do amor à terra morena, ao legado de paciência dos índios, à força construtora dos que vieram de longe lançar raízes de progresso em seu solo acolhedor.

Vibro com o trabalho dos atores do teatro e da dança que reinventam a vida em todos os seus aspectos, quando fazem da voz, do gesto, um rito de louvor à existência, à vida e a seus mistérios...

O palco não precisa ser grandioso nem sofisticado, porque mesmo a rua lhes serve de espaços para encenações em que trazem de volta o passado e reconstroem pedaços do presente definidores de identidades como se num jogo de espelhos captassem perdidas memórias.

Saúdo os arquitetos que deram sentido à vida urbana, projetaram monumentos de pedra e cal nos quais imprimiram o signo de liberdade essencial às conquistas humanas. Louvo os pintores, desenhistas, escultores e, de modo geral, os artistas plásticos que têm olhos mágicos capazes de dar cor, forma e movimento a coisas pequeninas, nesse milagre de transubstanciação de que a arte é soberana.

Sou irmã dos que brigam com as palavras, reconstroem o mundo, sem medo de enfrentar a verdade, preocupados apenas em fazer da escrita um exercício de integração com o outro, no desafio ao tédio limitador de aspirações.

Em Campo Grande estão as cinzas dos que amei, as lembranças da infância e juventude, as escolas, os espaços culturais onde os roseirais do talento se abrem em flores de sabedoria, que embalam meu sono do qual não tenho vontade de acordar.


Campo Grande, cidade movida pela paixão, sentimentos que liga seus habitantes a objetivos geradores de crescimento e paz interior é minha pátria.


Maria da Glória Sá Rosa